Morreu Ornette Coleman, mas não…
Morreu hoje, 11 de Junho, um dos últimos gigantes do jazz que ainda tínhamos entre nós: Ornette Coleman. Contava com 85 anos de idade. A sua vida e a sua música estão para sempre ligadas à memória emocional dos portugueses: foi no seu concerto no primeiro Cascais Jazz, em 1971, que o contrabaixista que o acompanhava, Charlie Haden, dedicou o tema “Song For Che” aos movimentos de libertação das ex-colónias, levantando o público numa ovação entusiástica que anunciava já a revolução dos cravos.
Ornette foi sempre um visionário da música. Com “The Shape of Jazz to Come” (1959) levou o hard bop para o que acabaria por ficar conhecido como free jazz, e isto devido ao título de um disco posterior seu (“Free Jazz”, de 1960). Desenvolveu um novo método musical a que deu o nome de harmolodia. Com o grupo Prime Time rodeou-se de duas guitarras e dois baixos eléctricos, algo de inédito mesmo no jazz de fusão. Gravou com os marroquinos Master Musicians of Jajouka o saltitante “Dancing in Your Head”. Tocou violino fazendo tábua-rasa de todos os ditames técnicos clássicos para o instrumento. Convidou para tocar consigo tanto o guitarrista de folk-rock Jerry Garcia, dos Grateful Dead, como o tablista de música clássica indiana Badal Roy e até – ele que não apreciava a rigidez temperada do piano – o pianista Joachim Kuhn. Compôs para orquestra sinfónica o majestático "Skies of America".
As suas perspectivas musicais eram não apenas práticas como também filosóficas. Tinha uma grande admiração pelo pensamento de Buckminster Fuller, o arquitecto-inventor-“designer” que também influenciou John Cage, e o seu encontro com Jacques Derrida fez história. Poucos como ele mudaram tanto o curso da arte dos sons. Parecia imortal – tal como Cecil Taylor, com 86 anos, nos parece eterno –, mas a natureza acabou por pôr um termo à sua carreira de seis décadas. O coração parou-lhe. O que criou está, no entanto, registado e a sua influência disseminou-se pelos quatro cantos do mundo. É como se continuasse por cá. O seu nome será repetido enquanto houver música e seres humanos.