Bruno Tocanne: “Sea Song(e)s” (Cristal Records)
Depois da sua participação na homenagem a Syd Barrett – o membro dos Pink Floyd que enlouqueceu logo após os primeiros discos da banda – prestada há uns anos pelo I.Overdrive Trio, e depois ainda da revisão feita pelo seu Imuzzic Grand Ensemble da ópera jazz “Escalator Over the Hill” de Carla Bley e Paul Haynes, não surpreende saber que Bruno Tocanne encontrou agora uma fonte de inspiração na obra-prima “Rock Bottom” de Robert Wyatt, o ex-Soft Machine que se tornou numa das mais importantes vozes da história da pop. Muito claramente, o baterista, compositor e arranjador francês de 62 anos de idade está a fazer contas com as suas referências musicais de juventude.
Na agora surgida, vai buscar o mesmo trompetista que tocou em “Hommage à Syd Barrett” e em “Over the Hills”, Remi Gaudillat, e o cantor que representou todos os papéis musicados para os convidados vocais da Jazz Composers Orchestra, Antoine Lang. Nesta trajectória de recuperação e actualização das jóias da música do século XX, Tocanne tem neles os seus principais cúmplices. Desta vez, porém, não se trata de decompor e virar do avesso o mais celebrado disco de Wyatt – o dito serve apenas como inspiração para composições do próprio líder desta sessão, da pianista Sophia Domancich (a meias com John Greaves, antigo membro dos também progressivos, e contemporâneos dos Soft Machine, Henry Cow – a banda em que Fred Frith se deu a conhecer), de Gaudillat e de Lang, este na companhia de Marcel Kanche, patrão da Cristal Records e membro de outro grupo do rock-jazz experimental da década de 1970, Un Département. Apenas um tema de “Rock Bottom” (“Sea Song”) é tocado aqui, fechando o alinhamento, mas as canções originais do quarteto de Tocanne interiorizaram bem as fórmulas wyattianas e manipulam-nas com um misto de respeito e irreverência quanto baste. Ao que parece, o homem das longas barbas brancas gostou.