Fred Frith / Hans Koch: “You Are Here” (Intakt)
Saído em 2017 de um registo efectuado no ano anterior no Jazz Campus, em Basel (imaginamos um espaço de grandes dimensões e pé alto, tal a ressonância), este disco escapou às minhas audições no ano passado, ou teria ido directamente para a minha lista de Melhores. É assim tão impressionante, destacando-se entre os cerca de 400 que Fred Frith, um dos dois participantes, tem editados. Ao lado do ex-Henry Cow está o suíço Hans Koch, com quem já tinha tocado antes desta colaboração como convidado do trio de “música de câmara hardcore” (porque tocando algo que está na intersecção do jazz, da improvisação livre, do rock, do experimentalismo electroacústico e da música contemporânea) que o clarinetista baixo e saxofonista (soprano e tenor) mantém com Martin Schutz e Fredy Studer. Se anteciparmos o mergulho nos sete temas reunidos em “You Are Here” com base naquilo que conhecemos de ambos, a surpresa ainda é maior: os dois veteranos conseguem ir ainda mais longe do que tinham ido cada um para o seu lado ou em conjunto no contexto referido, e isso é uma raridade, mesmo com tão criativas figuras como estas.
O que ouvimos é, regra geral, pausado no andamento e com um volume moderado, por vezes chegando-se mesmo ao limiar do murmúrio, mas a música não podia ser mais ameaçadora e sombria. Frith posiciona-se entre dois âmbitos, o do ruído propriamente dito, com preparações na guitarra e um trabalho tendencialmente percussivo, e o da construção harmónica, com generoso uso da pedaleira de efeitos e um entendimento iminentemente electrónico dos sons. Kock contorna, pelo seu lado, as abordagens melódicas ou frásicas a que os sopros de palheta convidam, mas não as impede de surgirem. Prefere a manutenção de “drones” ou de texturas, tão abstractas quanto emocionais, imagéticas e até cinematográficas. Para tal faz um uso igualmente generoso da saliva, e tanto assim que esta surge na instrumentação indicada como um recurso mais. Se os resultados parecem, por vezes, de origem alienígena, são corpos, seres humanos, que adivinhamos por detrás de tudo. A beleza pode ser negra e inquietante e aqui está um fantástico exemplo disso mesmo.