Em topo de forma

Luís Vicente

Em topo de forma

Multikulti Project

texto Rui Eduardo Paes

O trompetista de Lisboa tem dois novos títulos saídos quase em simultâneo pela “label” polaca Multikulti Project. Dois títulos muito diferentes que nos confirmam que o músico está a viver uma óptima fase do seu percurso, com os circuitos internacionais a prestarem-lhe a atenção que merece. A jazz.pt deitou-lhes o ouvido e é como segue.

Com uma vintena de discos já na sua discografia, uma boa parte dos quais editados por etiquetas de outros países, o trompetista português Luís Vicente está a viver o melhor momento do seu percurso. Agora, foi a polaca Multikulti Project que lançou, quase em simultâneo, mais dois títulos com o seu nome em primeiro plano. Num encontramo-lo com o saxofonista brasileiro, residente em Portugal, Yedo Gibson e com o baterista luso-catalão Vasco Trilla (“L3”) e no outro (“Live at Ljubljana”) os seus parceiros são o belga Seppe Gebruers e o holandês Onno Govaert. Tal como os restantes títulos em que o podemos ouvir, são bastante diferentes os conteúdos em oferta – o que confirma a elasticidade tanto do seu estilo pessoal quanto dos projectos em que se envolve, confirmando que aquilo a que chamamos “música improvisada” não é propriamente uma corrente uniforme.

“L3” equaciona-se entre dois continentes desse mais amplo mundo. De um lado está uma abordagem textural, abstracta e com generoso uso de técnicas extensivas, sem qualquer recurso às noções convencionais de melodia, harmonia e ritmo, distinguindo-se da corrente reducionista apenas pelo “excesso” de elementos sonoros, pelo volume e pela intensidade. Ainda que não exista qualquer tipo de tratamento electrónico, as construções remetem-nos ainda para a improvisação electroacústica – inclusive, trompete, saxofone soprano (mais do que o tenor, instrumento com que Gibson é um “jazzman”) e percussão mais parecem sintetizadores. Do outro está um regresso à linguagem do free jazz, sobretudo a da “loft generation”, com os fraseados jazzísticos típicos (até pela referenciação no bop e no pós-bop), ainda que quebrados, e uma sustentação que, se dispensa métricas, é pulsativa e tem “drive”. Os dois polos condutores não surgem apenas à vez – o mesmo tema pode incluí-los aos dois, num curioso vai e vem. Neste contexto, Luís Vicente tanto nos faz pensar no Axel Dorner mais experimental como em Olu Dara.

Em “Live at Ljubljana” conjugam-se um entendimento de câmara, com directas e indirectas referências à música erudita contemporânea (estas não provindo apenas do pianista, Gebruers, mas também, e curiosamente, do baterista, Govaert) e intervenções especificamente jazz, sobretudo da parte de Vicente, que neste disco se posiciona mais como músico do género em causa, ligando-se à tradição, do que alguma vez acontece em “L3”. Enquanto neste CD de estúdio (o Namouche de Lisboa) há como que um movimento pendular entre improvisação livre e free jazz, o que se passa com o gravado ao vivo no esloveno Sound Disobedience Festival é bem diferente: os factores clássicos emolduram os do jazz, sendo de sublinhar que este jazz não é propriamente o da “estética do grito” glosada no outro registo. O trompete de Luís Vicente surge aqui mais construído, mais torneado, mais Freddie Hubbard do que Don Cherry (as suas duas grandes influências).

Para além do próprio Vicente, que se mostra no auge das suas capacidades em ambos os discos, há que aplaudir os desempenhos de Vasco Trilla em “L3” e de Seppe Gebruers em “Live at Ljubljana”, um como “bricoleur” de sons com uma imaginação inesgotável, por vezes não parecendo mesmo provenientes de uma bateria, e o outro devido à forma como faz com que o extremamente complexo pareça simples, nunca confundindo elegância com “boa educação”. Ambas as edições são excelentes, mas para estes ouvidos impõe-se a de capa negra: “L3” surpreende-nos como pouca música hoje vai conseguindo.

  • L3

    L3 (Multikulti Project)

    Luís Vicente / Yedo Gibson / Vasco Trilla

    Luís Vicente (trompete); Yedo Gibson (saxofones soprano e tenor); Vasco Trilla (bateria, percussão)

  • Live at Ljubljana

    Live at Ljubljana (Multikulti Project)

    Luís Vicente / Seppe Gebruers / Onno Govaert

    Luís Vicente (trompete); Seppe Gebruers (piano); Onno Govaert (bateria)

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