Stephen Gauci: Vários

Stephen Gauci: Vários

Gaucimusic

António Branco

O saxofonista norte-americano Stephen Gauci está numa fase de particular atividade, apresentando nesta primavera/verão nada mais nada menos do que seis gravações novas, em diferentes configurações instrumentais, documentando o estado-da-arte na fervilhante cena do jazz e da música improvisada de Brooklyn, Nova Iorque.

Para Stephen Gauci (n. 1966) este conjunto de gravações «são uma forma de documentação do que estava/está a acontecer em Brooklyn no momento em que foram registadas. O que realmente está a acontecer. Não é uma “apresentação em estúdio”, não é um “ensaiámos durante três meses e agora estamos a gravar em estúdio”. É importante para mim apresentar e documentar o que realmente está a acontecer num determinado momento. O bom, o mau, o feio. Os sons agradáveis e os defeitos. Tudo isso. É isso que estou a apresentar, e é isso que é o jazz.» explica o saxofonista à jazz.pt. Os títulos dos álbuns são diretos, despretensiosos, sem grandes noções abstratas de espiritualidade e sem arte abstrata nas capas…

Stephen Gauci é há muito reconhecido como um dos saxofonistas mais originais da cena musical improvisada de Nova Iorque. Acometido por uma doença de infância que o deixou com uma profunda perda auditiva, foi atraído pela sonoridade clara do saxofone tenor. Este foi o passo que encetou um relacionamento especial com a música ao longo da vida e um contínuo processo de investigação de som e timbre e, sobretudo, de desenvolvimento de uma voz interior. Ao longo de um rico percurso, Gauci tocou e gravou com muitos dos principais improvisadores do nosso tempo, incluindo Cooper-Moore, Joe Morris, Nels Cline, Karl Berger, Kris Davis, Tyshawn Sorey, Daniel Carter, George Garzone, Nate Wooley, William Parker, Steve Swell, Mike Bisio, Adam Lane, Kevin Shea, William Hooker, Ingebrigt Haker Flaten, Dave Rempis, entre muitos outros. As aulas de música que ministra são outra vertente da sua forma de estar na vida e na música.

«É importante para mim apresentar-me a mim mesmo, ao meu trabalho, à minha vida, como um exemplo do que significa ser um músico sério, um artista sério, em 2022. Sinto que precisamos de uma correção de curso. E estou a liderar pelo exemplo. Por outro lado, a música vem quando quer também, não é uma “escolha de carreira”. Neste momento, a música está a sair. Estou no meu auge, no pico do desempenho. A música está a compelir-me a produzir, a exigir que eu produza e é isso que estou a fazer. Não é uma escolha. É uma chamada. Aqueles músicos que produzem por “escolha” ou “considerações de carreira”, estão a fazer algo diferente de mim. Não estou a criticá-los, mas estamos a fazer coisas diferentes», sublinha o músico a traço grosso.

Gauci dirige a Bushwick Improvised Music Series, onde já apresentou centenas de concertos com muitos dos maiores improvisadores de Nova Iorque, bem como muitos músicos internacionais em digressão pela Big Apple. O seu quarteto de trabalho é constituído pela guitarrista Sandy Ewen, o contrabaixista Adam Lane e o baterista Kevin Shea. Com uma discografia já com dezenas de títulos, como líder ou colíder – de entre os quais “Nididhyasana” (2007), com Nate Wooley, Mike Bisio e Ingebrigt Haker Flaten e “Three” (2010), do trio SKM, com Kris Davis e o mesmo Bisio, na portuguesa Clean Feed –, continua a procurar novos caminhos para a sua música. Atualmente dirige também a Gaucimusic Recordings, lançando gravações ao vivo e em estúdio, nutrindo, documentando e mostrando ao mundo a cena musical improvisada incrivelmente diversificada, multigeracional e inovadora de Brooklyn.

Em Cooper-Moore/Stephen Gauci, Live at Roulette” escutamo-lo ao lado do aclamado pianista Cooper-Moore. Tendo completado uma residência de sete meses na entretanto encerrada galeria HappyLucky No. 1, em Brooklyn, o duo dá continuidade às gravações anteriores e continua as suas explorações com esta performance gravada ao vivo no Roulette (Brooklyn) durante o confinamento motivado pela covid-19 em 2020. Ambos os músicos, unidos pela «busca da verdade através da música e abraçando os ideais de bondade e integridade», oferecem esta gravação como um marco na sua jornada musical conjunta de cinco anos.

Em “Soundlift Berlin-New York” encontramos o saxofonista numa formação de luxo que se completa com o baterista Joe Hertenstein, o pianista Alexander von Schlippenbach e o contrabaixisita Jan Roder. Ao saber dos planos de Gauci para visitar Berlim em outubro de 2021, Hertenstein sugeriu e ajudou a organizar uma sessão de gravação com Roder e Schlippenbach. Após um voo transatlântico de sete horas e uma viagem de comboio de cinco, encontraram-se no estúdio Keller4. Uma simbiose entre quatro músicos – com distintas personalidades musicais –, dois continentes, três gerações, para a qual confluem passado, presente, futuro. Um disco notável, intenso e urgente, que melhor se desvenda com sucessivas e atentas audições.

“Live at Scholes Street Studio” mostra a música de um trio com Gauci, a guitarrista Wendy Eisenberg e o baterista Francisco Mela. Os três conheceram-se enquanto se apresentavam com vários conjuntos no verdadeiro caldeirão musical conhecido como Bushwick Improvised Music Series. Depois de iniciar uma relação musical com Eisenberg, documentada na série de gravações “Pandemic Duets”, levantou-se a questão de uma apresentação em trio. Mela, que toca nos grupos dos ex-professores de Gauci, Joe Lovano e George Garzone, foi a escolha natural. Os três improvisadores oferecem uma visão fresca e contemporânea do clássico trio de jazz sem contrabaixo.

Gravado ao vivo perante casa cheia no Sowieso – clube berlinense dedicado à música mais exploratória –, “Live at Sowieso, Berlin” documenta o encontro de membros do grupo da Bushwick Series, Gauci e o baterista Kevin Shea, e a designer/teclista Liz Kosack e o baixista Dan Peter Sundland, de Berlim. Transcendendo a distância geográfica e cultural, este álbum é mais um exemplo do forte e crescente vínculo criativo entre as comunidades de música improvisada de Brooklyn e Berlim.

Quando a pandemia de covid-19 atingiu em cheio a cidade de Nova Iorque, no inverno de 2020, um dos efeitos profundos no cenário musical foi que muitos músicos deixaram a cidade para regressarem aos seus países, estados e cidades de origem. Com a lenta reabertura, no verão de 2021, os músicos começaram a voltar a Brooklyn. Nesse contexto, o contrabaixista Thomas Helton procurou Gauci e contou-lhe os seus planos de se mudar da sua cidade natal, Houston, para Brooklyn. Uma sessão de gravação estava prestes a acontecer e a guitarrista Sandy Ewen, texana que havia regressado recentemente a Brooklyn, revelou-se o contraste perfeito para o som melancólico e penetrante de Helton. Joe Hertenstein estava na cabeça de todos para ocupar o lugar na bateria. Embora este se tenha refugiado no seu apartamento em Berlim durante os confinamentos da covid, conseguiu viajar para Brooklyn a tempo da sessão que deu origem a “Live at Scholes Street Studio”. Assim, tal como a lampreia encontra o seu caminho de volta rio acima para os seus locais de reprodução ancestrais, os músicos encontraram os respetivos caminhos de volta ao seu terreno comum mais criativo.

Para o final fica “Solo Improvisations”, também registado durante o confinamento da covid-19 em 2020, que revela toda a riqueza do vocabulário do saxofonista, constituindo um instantâneo no tempo da linguagem musical muito pessoal e em constante desenvolvimento de Stephen Gauci e um testemunho de uma voz sempre à procura de se dar a conhecer de formas novas e inauditas.

Para Stephen Gauci, o futuro é já ali: «Estou focado como um laser em expandir e consolidar a minha rede de relações musicais na Europa. Espero fazer digressões, concertos e gravações regularmente no continente nos próximos meses/anos. É tudo muito empolgante, e estou ansioso para conhecer/atuar com muitos novos colegas num futuro próximo. A vida é para ser vivida. A música é para ser tocada. Eu não vou desperdiçá-la. Nem um minuto. É demasiado preciosa.»

  • Live at Roulette

    Live at Roulette (Gaucimusic)

    Cooper-Moore/Stephen Gauci

    Cooper-Moore (piano); Stephen Gauci (saxofone tenor)

  • Soundlift Berlin-New York

    Soundlift Berlin-New York (Gaucimusic)

    Stephen Gauci/Joe Hertenstein, featuring Alexander von Schlippenbach & Jan Roder

    Stephen Gauci (saxofone tenor); Alexander von Schlippenbach (piano); Jan Roder (contrabaixo); Joe Hertenstein (bateria)

  • Live at Scholes Street Studio

    Live at Scholes Street Studio (Gaucimusic)

    Stephen Gauci/Wendy Eisenberg/Francisco Mela

    Stephen Gauci (saxofone tenor); Wendy Eisenberg (guitarra); Francisco Mela (bateria)

  • Live at Sowieso, Berlin

    Live at Sowieso, Berlin (Gaucimusic)

    Stephen Gauci/Liz Kosack/Dan Peter Sundland/Kevin Shea

    Stephen Gauci (saxofone tenor); Liz Kosack (sintetizadores); Dan Peter Sundland (baixo elétrico); Kevin Shea (bateria)

  • Live at Scholes Street Studio

    Live at Scholes Street Studio (Gaucimusic)

    Stephen Gauci/Sandy Ewen/Thomas Helton/Joe Hertenstein

    Stephen Gauci (saxofone tenor); Sandy Ewen (guitarra); Thomas Helton (contrabaixo); Joe Hertenstein (bateria)

  • Solo Improvisations

    Solo Improvisations (Gaucimusic)

    Stephen Gauci

    Stephen Gauci (saxofone tenor)

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