Carate Urio Orchestra: “Cosmos” (Klein)

Carate Urio Orchestra: “Cosmos” (Klein)

Klein

António Branco

A Carate Urio Orchestra é apenas uma das fileiras criativas pelas quais se divide o trabalho multímodo do clarinetista, saxofonista e estratego sonoro belga Joachim Badenhorst. “Cosmos” é o seu saudavelmente incategorizável novo disco que a jazz.pt já ouviu.

Depois de “Adventa”, poema musical baseado num clássico da literatura nórdica escrito em 1936 por Gunnar Gunnarsson, onde surgiu acompanhado pelo quarteto islandês Mógil (recenseado na jazz.pt aqui), Joachim Badenhorst (n. 1981)  - LAMA, Han Bennink Trio, Baloni - retoma em “Cosmos” a sua Carate Urio Orchestra, formação de xadrez instrumental variável e que raramente soa como uma big band na aceção jazzística. A ele juntam-se agora Jeremy Thal na trompa e trompete, Liz Kosack no sintetizador, Simon Jermyn no baixo elétrico e guitarra elétrica, Brice Soniano no contrabaixo e eletrónicas, Bert Cools nas guitarras elétricas e Sean Carpio na bateria, todos músicos com créditos firmados na cena da Europa central como improvisadores e líderes dos seus próprios projetos.

Músico com relevante percurso nos domínios do jazz e da música improvisada, mas de horizontes mais alargados, Badenhorst tem dado o seu contributo para esbater fronteiras entre improvisação e composição, explorando paisagens sonoras diversas e desenvolvendo uma linguagem estilística pessoal que absorve e processa elementos de diferentes territórios sonoros, do jazz e da improvisação livre a atmosferas clássicas de câmara, rock progressivo, psicadelismo e new age, em proporções distintas. Da mais pura das melodias a sons esdrúxulos, e o que acontece pelo meio, tudo pode acontecer e numa fração de segundos.

Em “Cosmos”, a mais recente etapa de um percurso que já conta com discos como “Sparrow Mountain” (2013), “Lover” (2016) e o notável “Garlic & Jazz” (2017) – os melómanos portugueses conhecerão porventura a formação através de “Ljubljana”, disco gravado ao vivo na capital eslovena e editado pela Clean Feed (Soniano e Carpio são os únicos sobreviventes dessa formação) – Badenhorst explora agora outros recantos da sua mundividência sonora, para a qual tanto são convocadas paisagens sonoras acessíveis (mas mesmo assim só aparentemente simples) como outras mais densas ou de contornos  abstratos.

Neste disco conceptual – quase ao jeito do prog de setentas –, é-nos contada a história do último pântano na Terra após um evento cataclísmico, um derradeiro reduto de vida, cápsula de vidro a flutuar no espaço. Neste ecossistema fechado vivem 13 espécies de musgo, 12 de samambaias, 3 sapos (todos da mesma espécie) e um homem, chamado Doug, que aprende a linguagem dos sapos e que transcreve o seu Livro Sagrado. Curiosos?

Esta fábula sci-fi inicia-se com as eletrónicas planantes de “The Outer Space” que dão lugar ao balanço familiarmente reconfortante de “A Tear Fell from the Forlorn Sky”. O paisagismo de “Little Floating Biosphere” antecede “Doug”, onde das eletrónicas pop reminiscentes do início da facilmente olvidável década de 1980 emerge um trompete que conduz a uma erupção rítmica, massa de sopros em ordenada efervescência (as palavras em neerlandês põe-nos fora de jogo neste plano).

“Mechanical Pencils” é mais aventureira, vibrante caleidoscópio marcado por um groove estranho, mesclando sons reconhecíveis com outros de proveniência ignota. “It Was Just the Beggining for Them” (aqui na língua de Shakespeare) relembra-nos que o fim é sempre o princípio de outra coisa. O início solene de “The Frog Chair” evolui para uma dança garrida, espelho da esperança num futuro pacífico e próspero (que nos valham os sapos) revelado num livro sagrado que Doug escrevinha nas paredes de vidro do espaço que partilham. Peça de recorte camerístico melodicamente refinado, “Some 100.000 Years”, a mais extensa do disco, e porventura o seu pináculo, tem no baixo elétrico a sua pedra angular, eletrónicas subtis e os clarinetes de Badenhorst a urdir um belo fio melódico. A vinheta “New Home” é antecâmara para “Lil’ Doug”, a celebratória peça final.

Viagem sonora com momentos interessantes, “Cosmos” recompensa sobretudo quem não se dispuser a habitar numa bolha.

 

  • Cosmos

    Cosmos (Klein)

    Carate Urio Orchestra

    Joachim Badenhorst (clarinete, saxofone tenor, eletrónica, voz); Liz Kosack (sintetizador); Simon Jermyn (baixo elétrico, guitarra elétrica); Brice Soniano (contrabaixo, eletrónicas); Bert Cools (guitarras elétricas); Sean Carpio (bateria); Jeremy Thal (trompa, trompete, narração)

Agenda

25 Março

Duke Ellington’s Songbook

Sunset Jazz - Café 02 - Vila Nova de Santo André

25 Março

Mário Laginha com Orquestra Clássica da Madeira

Assembleia Legislativa da Madeira - Funchal

25 Março

The Rite of Trio

Porta-Jazz - Porto

25 Março

Sofia Borges (solo) “Trips and Findings”

O'culto da Ajuda - Lisboa

25 Março

George Esteves e Kirill Bubyakin

Cascais Jazz Club - Cascais

25 Março

Katerina L’Dokova

Auditório ESPAM - Vila Nova de Santo André

25 Março

Kurt Rosenwinkel Quartet

Auditório de Espinho - Espinho

26 Março

Giotto Roussies Blumenstrauß-Quartett

Cantaloupe Café - Olhão

26 Março

João Madeira, Carlos “Zíngaro” e Sofia Borges

BOTA - Lisboa

26 Março

Carlos Veiga, Maria Viana e Artur Freitas

Cascais Jazz Club - Cascais

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