Do Acaso: “Catarse Civil”  (Carimbo Porta-Jazz)

Do Acaso: “Catarse Civil” (Carimbo Porta-Jazz)

Carimbo Porta-Jazz

Nuno Catarino

Da mais nova geração Porta-Jazz nasce mais uma bela surpresa: um jazz onírico que tem prazer a flirtar com a literatura.

Não será nenhuma novidade, mas neste ano de 2022 o Carimbo Porta-Jazz tem revelado algumas boas surpresas, especialmente vindas de novos talentos, e muito particularmente de jovens mulheres (excelente sinal, neste universo tradicionalmente patriarcal). No catálogo de edições deste ano já se destacaram os discos “Ninhos” de Joana Raquel, “Liquify, Spread and Float” de Inês Malheiro e “Membrana” de 293 Diagonal. Este Catarse Civil”, pelo projeto Do Acaso, é mais uma edição que se vai juntar a um já belo lote de música criado por jovens músicos que, partindo do jazz, vai cruzar outros universos sonoros e nunca deixa de surpreender.

A “Catarse Civil” nasceu do convite lançado por Sara Santos Ribeiro (contrabaixista e compositora) a Sofia Teixeira (escritora) e o projeto reúne um conjunto de jovens talentos: Joana Raquel (voz), Sofia Sá (voz), Pedro Matos (saxofone tenor), Pedro Jerónimo (trompete), André Ramalhais (trombone), Tiago Baptista (vibrafone), Catarina Rodrigues (teclas, sintetizador e voz), Miguel Meirinhos (piano), Sara Santos Ribeiro (contrabaixo), Zé Stark (bateria), com direção dos maestros Jan Wiezba e Paulo Filipe de Carvalho. Inclui a participação dos atores/diseurs Gisela Ribeiro, Rui Spranger e Joana Carvalho e conta ainda textos de Hugo Santos e Jorge Santos Ribeiro. A informação disponibilizada não é muito clara sobre os contributos individuais para a composição, fica a ideia de que o trabalho de composição resultou do envolvimento coletivo de todos os músicos participantes (instrumentistas e cantores).

O projeto propõe-se explorar a ligação entre a música e a literatura e, na sua apresentação, promete: «Um exercício neo-surreal de materializar “os sonhos da humanidade que dorme” (...) imaginemos que a humanidade é uma pessoa que dorme. Imaginemos que nos seus sonhos os movimentos sociais dançam numa libertação explicita das suas vontades. Imaginemos que colocamos isso em palco, acessível aos olhos de todos.» Um desafio curioso...

O disco abre com o tema “Marca páginas, o precário” (ótimo título): primeiro um piano pingado e o violoncelo com melancolia, mas o tema vai evoluindo, crescendo, transformando-se, até fechar com voz delicada. Ao segundo, “Explosão frenética”, a voz masculina serve um texto introdutório, entrando depois o tapete instrumental, com os sopros bem alinhados; o tema vai seguindo uma estrutura jazz convencional, incluindo solos interessantes. Seguem-se “Mingo, poor Mingo” e “Caleidoscópio”, explorando diferentes ambientes musicais, sempre a demonstrar a boa envolvência coletiva, vozes e instrumentos em perfeita ligação, além de exibirem elevada qualidade técnica.

O mais interessante, e emblemático, tema de todo o disco será o quinto, “Formas de me trazer ao mundo da consciência”: depois de um breve início cantado, vai sendo contada em spoken word uma história, uma peça de prosa-poética de quotidiano (um/a passageiro/a que adormece no autocarro e não acorda), com traços leves de surrealismo; e a música vai acentuando as emoções do texto (e a sua natureza subversivamente humorística).

A música pode ter muitas formas e o objetivo de materializar sonhos numa forma musical – interpretação que pode ter diferentes leituras – terá sido concretizado. A natureza onírica desta música será evidente, servindo-se do jazz como ferramenta base de trabalho, mas expandindo-se para lá das suas fronteiras habituais. O resultado é uma música que sonha e vai fluindo, num disco que parte do jazz e se assume profundamente original e criativo.

Aqui está mais uma pérola da nova geração Porta-Jazz.

 

 

  • Catarse Civil

    Catarse Civil (Carimbo Porta-Jazz)

    Do Acaso

    Joana Raquel (voz); Sofia Sá (voz); Pedro Matos (saxofone tenor); Pedro Jerónimo (trompete); André Ramalhais (trombone); Tiago Baptista (vibrafone); Catarina Rodrigues (teclas, sintetizador e voz); Miguel Meirinhos (piano); Sara Santos Ribeiro (contrabaixo); Zé Stark (bateria); Jan Wiezba (direção);  Paulo Filipe de Carvalho (direção); Gisela Ribeiro (spoken word); Rui Spranger (spoken word); Joana Carvalho (spoken word); Hugo Santos (texto); Jorge Santos Ribeiro (texto)

Agenda

23 Março

Anthropic Neglect

Miradouro de Baixo - Carpintarias de São Lázaro - Lisboa

23 Março

João Almeida e Miguel Fernández

Café Dias - Lisboa

23 Março

George Esteves

Cascais Jazz Club - Cascais

23 Março

Sei Miguel Unit Core

Livraria Ferin - Lisboa

23 Março

Alex Zhang Hungtai e Gabriel Ferrandini / Guilherme Curado

Titanic Sur Mer - Lisboa

23 Março

Manuel Oliveira, Rodrigo Correia e Guilherme Melo

Fábrica Braço de Prata - Lisboa

24 Março

Margaux Oswald

Cossoul - Lisboa

24 Março

The Comet Is Coming

Lisboa Ao Vivo - Lisboa

24 Março

Alessio Vellotti Group

Cascais Jazz Club - Cascais

24 Março

Blind Dates

Porta-Jazz - Porto

Ver mais