SeixalJazz 2022
O Seixal entre o sólido e o gasoso
Aproximamo-nos velozmente da data de abertura do SeixalJazz, o festival outonal da margem sul. É francamente difícil antever a edição deste ano pois o festival é hoje uma versão muito diferente do que já foi, pendulando entre diferentes mundos, sem uma linha programática lógica e com uma largueza estilística desconcertante.
Precendo apostado em mudar de públicos e orientação o SeixalJazz regressará com dois palcos, o tradicional Auditório Municipal do Fórum Cultural do Seixal, e no novo SeixalJazz Clube, na Sociedade Filarmónica Democrática Timbre Seixalense. Por estranho que possa parecer, e depois de analisado o programa, será o clubbing a ter o programa mais vivo (e ainda por cima gratuito). Aprofundemos.
Vai abrir no palco principal com o trio do pianista jamaicano Monty Alexander no dia 13 de outubro, quinta-feira, às 22 horas. Será um concerto fácil, onde sambas, reggaes e outros formatos solarengos são passados a ferro por um jazz decorativo. Um concerto para um público radicalmente diferente daquele que se habituou a ir ao Seixal ouvir John Abercrombie, Dave Holland, Paul Motian, Ken Vandermark, Craig Taborn, Tony Malaby ou Colin Stetson.
No mesmo dia, à noite, a música será muito mais viva e aliciante no SeixalJazz Clube com o quinteto de Demian Cabaud. Para além do contrabaixista argentino a residir em Portugal estará em palco um grupo imperdível com João Pedro Brandão no saxofone alto e flauta, José Pedro Coelho no tenor e clarinete baixo, João Grilo no piano e Marcos Cavaleiro na bateria.
No dia seguinte, 14, virá o Mário Laginha Trio. Mudamos drasticamente de pé em relação ao dia anterior e – apesar de estarem presentes referências brasileiras e africanas –o trio com Bernardo Moreira no contrabaixo e Alexandre Frazão virá apresentar o disco “Jangada”, editado no início do ano. Podemos dizer que a Pandemia jogou a favor da música neste caso e que o trio, que não gravava discos desde 2007 (“Espaço” na Clean Feed), voltou à composição e ao estúdio. Podemos contar com a fluidez melódica de Laginha e um trio coeso que teve o tempo para explorar novos caminhos e soluções para este formato.
No clube estará o MAZAM de João Mortágua. Um quarteto notável que consegue responder à escrita criativa e exigente do saxofonista (Carlos Azevedo, no piano, Miguel Ângelo, no contrabaixo, e Mário Costa, na bateria). Em “Land”, o disco de estria na Porta-Jazz ouvimos desde logo uma música particular, do nosso tempo, que foi confirmada em “Pilgrimage”, editado este ano pela Clean Feed. Os MAZAM usam um jogo de sombras entre o que é tocado e o que é silenciado, num processo de descoberta que nos faz sentir que estamos a ouvir a música do nosso tempo.
Sábado 15, é o dia do trio italiano António Faraó. O do pianista e cantor usa uma linguagem elétrica, com o hip-hop a dominar. Estaremos no território da fusão (light) dado que virá em trio e sem a parafernália de cantores featured no disco (que incluem Snoop Dog). Estaremos mais uma vez na alçada da pop vestida de jazz.
E se a música no auditório pode ser insossa no clube promete-se chispa. O guitarrista Filipe Duarte traz o seu quinteto que de alguma maneira reflete a sua experiência de quatro de formação em Nova Iorque e depois de prática em Berlim. Da música de Duarte que já deixou ouvir conseguimos saber que “Vendaval” tem música serena, clássica. Descreve o disco que vai apresentar neste concerto, como tendo sido na força da natureza, incontrolável e imprevisível.
Com uma semana para descanso do pessoal, o Seixal retoma no dia 20 com o quarteto de Mário Barreiros, um grupo que toca correto e simples. O diálogo entre Ricardo Toscano no saxofone e Abe Rábade no piano é o grande segredo desta nova formação do baterista do Porto que assim assegura a dinâmica do grupo. O concerto marca o regresso às gravações com o disco "Dois Quartetos Sobre o Mar", 15 anos depois do último disco.
À noite o trompetista Gileno Santana animará a sessão no clube em trio como o sérvio Nemanja Delic, na bateria, e Rodrigo Correiano contrabaixo, num concerto que homenageiaa música de Lennie Tristano, Lee Konitz e Warne Marsh, músicos que inspiraram o primeiro álbum do trio editado pela Ubuntu.
É no dia 21 de outubro, sexta-feira, o concerto que promete reconciliar-nos com a memória das grandes noites com músicos americanos no SeixalJazz: o quarteto do trompetista Ambrose Akinmusire, com Sam Harris no piano, Joe Sanders no contrabaixo e Justin Brown na bateria. Este quarteto é um caso sério na resolução de antíteses entre tensão e libertação, simplicidade e complexidade. Neste regresso ao Seixal (onde tocou em 2014) iremos ouvir um processo em construção muito interessante de um jovem músico americano que, depois de ter atingido um grande sucesso com “Origami Harvest” (2018) procurou um caminho completamente diferente «On the Tender Spot of Every Calloused Moment» (2020), mais próximo de um som tradicional, mas que nem por isso é menos arriscado e interessante.
À noite, para quem queira continuar em música, pode ir ter com o guitarrista do Porto Eurico Costa e o seu trio. Mesmo no final do ano passado lançou o lançou o seu disco de estreia, «Copal» na Porta-Jazz, com Demian Cabaud e Marcos Cavaleiro. Tal como no disco iremos ouvir temas originais de Costa.
O último dia começa com Samara Joy que tem uma voz sedosa. Depois de um disco de estreia numa editora menor , o novo trabalho “Linger Awhile” foi lançado pela multinacional Verve/Universal e marca uma aposta da empresa na cantora. No concerto que apresenta no Seixal, Samara Joy sobe ao palco com o trio de músicos que a tem acompanhado nas suas digressões pela Europa, o pianista norte-americano Ben Paterson, o baixista francês Mathias Allamane e o baterista dinamarquês Malte Arndal. Para além de alguns standarts, Samara trará temas seus, maioritariamente canções ligeiras de amor.
E para fechar o festival em beleza, mais um trio, desta vez do trompetista Luis Vicente (com Gonçalo Almeida no contrabaixo e Pedro Melo Alves na bateria). Este trio tem um funcionamento muito particular com o contrabaixo a ser a cola que une bateria e trompete, capazes de partir em improvisações feéricas. Em 2021 lançou o álbum «Chanting in the Name of» na Clean Feed e que continua a apresentar ao vivo.