Kaja Draksler
Jazz é muita coisa
Lisboa recebeu um solo da pianista eslovena que veio acrescentar umas quantas notas ao debate aberto pelo ciclo Isto é Jazz?. Estivemos lá…
Curado por Pedro Costa, o ciclo Isto é Jazz? tem trazido, nos últimos cinco anos, muita da música que desafia as fronteiras do género. Entre novas abordagens ao jazz dito tradicional e apostas mais transgressoras, o pequeno auditório da Culturgest tem sido um palco privilegiado para reflectir sobre o que é jazz, música contemporânea, rock, etc.
Para o dia 13 de novembro, a proposta deste ciclo foi um solo da pianista Kaja Draksler. Se por momentos pareceu fácil responder à questão – sim, ouviu-se jazz –, em outros as referências eram demasiadas para catalogar a música desta jovem eslovena tão facilmente. Por um lado foi possível notar alguns fraseados-tiques do jazz contemporâneo nos dedos de Draksler (e os padrões harmónicos em crescendo que o jazz vai buscar ao pós-rock pós-Tortoise), mas por outro a pianista lembrou-nos o seu fascínio pelos compositores eruditos, com passagens a marcar as técnicas trabalhadas nos estudos para piano de Ligeti e outros.
Kaja Draksler tem repartido o seu percurso académico entre a música clássica e o jazz, com uma licenciatura em Piano Jazz e um mestrado em Piano Clássico, embora com uma tese sobre as estruturas internas das improvisações de Cecil Taylor. Essa dicotomia nota-se na postura em palco e na organização do repertório. No seu concerto, apresentou peças de compositores consagrados, uma canção tradicional eslovena e temas de sua autoria, presentes no disco “The Lives of Many Others”, editado recentemente pela Clean Feed.
Só a beleza
A intérprete parece dar importância ao som acima de tudo (Arte pela Arte), não se assumindo enquanto parte de um movimento estético ou cultural e despindo as peças de qualquer contexto social, ao ponto de só ficar a beleza do som do piano.
As suas influências estão em alguns dos pianistas mais reconhecidos da actualidade, como Vijay Iyer e Jason Moran, com os quais estudou numa estadia em Nova Iorque, ou como Ethan Iverson. Mas o passado é também uma fonte a que recorre, tendo tocado nesta ocasião uma peça em homenagem a Billie Holiday, o “Ruby, My Dear” de Thelonious Monk e uma peça de Chopin reinterpretada de forma fresquíssima.
Alguns dos momentos mais intensos da noite aconteceram com a pianista a socorrer-se de algumas percussões para “arranhar” as cordas num “beat”violento ou, na última peça antes do “encore”, conseguir um harmónico constante acompanhado por notas espaçadas a jogar muito inteligentemente com o silêncio.
A simpatia algo tímida de Kaja Draksler, falando um pouco sobre as músicas que ia tocando, contribuiu para cativar ainda mais o público, numa noite de sala lotada.