Gorilla Mask
Sem apelo nem agravo
O grupo de Peter Van Huffel passou por Portugal para assinalar o lançamento do seu novo disco, “Bite My Blues”, e uma das apresentações que por cá fez foi no conimbricense Salão Brazil. Aí se assistiu a um longo assalto sonoro que esmagou o público com a sua intensidade.
Os Gorilla Mask subiram no passado sábado, 19 de Julho, ao palco do Salão Brazil, em Coimbra. O trio originário da efervescente Berlim e formado pelo canadiano Peter Van Huffel e pelos alemães Roland Fidezius e Rudi Fischerlehner esteve em minidigressão por Portugal (paragens igualmente na Parede e em Lisboa), a propósito da apresentação do seu segundo álbum, “Bite My Blues”, lançado pela Clean Feed.
Pela formação / instrumentação ninguém poderia esperar um concerto calminho. Bateria e baixo eléctrico processado por efeitos? Saxofone? Lembra Full Blast, projecto do ruidoso Peter Brotzmann. Só poderia ser som bruto, directo, barulhento e certamente incómodo para a vizinhança comprometida com o descanso. Prometia e cumpriu. Os Gorilla Mask protagonizaram uma música que se embebeda fortemente no jazz, na improvisação sem rede e no hardcore, com apontamentos de sons gerados ou manipulados electronicamente.
Dito assim, poderíamos pensar nos seminais Naked City de John Zorn. Mas, ao passo que nesses se constrói através da colagem sonora – logo, uma aliança de elementos discretos, uma junção sem redefinição ou penetração de fronteiras estilísticas –, este trio constrói através da fundição; enquanto Naked City é uma peça multiforme, irregular e heterogénea, Gorilla Mask cria peças coesas e uniformes.
A sua performance em duas partes assemelhou-se a um comboio que inicia a viagem andando solidamente sobre carris, mas cuja velocidade anuncia que algures a meio do percurso – é uma questão de tempo – vai descarrilar com estrondo: a bateria de Fischerlehner – certeira e musculada – e o baixo de Fidezius – pesado e não raras vezes abrasivo – formam o motor com o qual o saxofone de Van Huffel ora colabora, em perfeita sintonia melódica com o baixo, ora induz entropia, barulhento e descontrolado.
Levantou-se poeira e instalou-se a acalmia. Van Huffel alongou-se em monólogos, enquanto Fidezius lentamente destruía, através do sobre-processamento de um baixo que tudo absorvia, criando pontos de inflexão sonora. Sem apelo nem agravo, voltaram à carga mal se recompuseram do estrondo.
Foi neste registo que os Gorilla Mask protagonizaram, em jeito de balanço, um concerto de alta intensidade – pelo assalto sonoro e pela expressividade sem meias medidas – e de grande desgaste – pelo concerto demasiado longo, tendo em conta a sua natureza. Constituiu uma dose talvez demasiado alta para um público que, de tanta pancada, terá sucumbido pela exaustão ainda antes do final.