Nervo#5
Geração “indie”
À quinta realização, o festival de um só dia (mas com cinco concertos) foi uma elucidativa mostra de alguma da melhor música que se vai fazendo nas franjas mais experimentais com a improvisação como característica comum. Ouviu-se jazz, rock, noise, electrónica e música “não-idiomática”, para além de tudo o que está entre essas tendências…
Aconteceu no dia 19 de Julho a quinta edição do Nervo, apresentando desta vez cinco projectos muito diferentes entre si. Estamos em plena temporada de festivais de Verão e aconteceu um alinhamento de sonho no Clube Recreativo dos Anjos.
Namazoo
O primeiro concerto da “noite”, ao fim da tarde por motivos de ruído, foi da banda Namazoo, quarteto do Barreiro a que se junta o Peter Brötzmann do Porto, Paulo Alexandre Jorge. A actuação foi pautada por um “feeling” de puberdade – muitas ideias (bastantes delas interessantes) a serem disparadas entre os domínios de um rock mais exploratório e o psicadelismo puro.
Os momentos mais bem conseguidos conseguiram elevar um “riff” a verdade universal, assumindo um stoner rock bastante seguro. Esses momentos mereciam ser prolongados, mas a banda pecou por alguma hiperactividade do baixo de Luís Canto, que dava notas e vida a mais a um som que beneficia de contenção. Também a bateria híbrida de André Neves se mostrou insistente nos sons eletrónicos, o que baralhava o “mood” porventura desejado.
Os solos da guitarra de Ricardo Graça e do barítono de Alexandre Jorge foram alguns dos pontos altos do concerto, mas demasiadas vezes chocavam um com o outro. Embora o saxofonista impusesse grande intensidade ao som, também deixava pouco espaço aos outros músicos.
José Bica, nos teclados, mostrou-se o grande responsável pela sonoridade “dream desert”, numa prestação muito boa a tentar segurar o som geral. Infelizmente, a banda deixou passar várias oportunidades para acabar mais cedo, prolongando demasiado um concerto que, salvo excepções, foi perdendo qualidade ao longo do tempo.
Bande à Part
O triângulo amoroso Bande à Part chegou, veio e venceu. Ao contrário de todas as outras bandas, este trio optou por tocar a sua música totalmente acústica, obrigando a audiência a agarrar-se à prestação desde o primeiro segundo. Mesmo sendo improvisação não-idiomática transportava em si os sonhos de cada um dos músicos. Cada um à sua maneira, os três exímios músicos interligam-se de forma muito inteligente e a fugir à norma. A subversividade começa pela formação: Ricardo Ribeiro nos clarinetes, Joana Guerra no violoncelo e Carlos Godinho em percussão e objectos pouco comuns.
Ribeiro e Guerra tenderam a desenhar formas, ainda que abstractas, e Godinho, eterno provocador, procurou sempre desalinhar as ideias existentes com propostas de novos caminhos. Num concerto que deixou os presentes de boca aberta e sem palavras, é porventura difícil fugir ao facilitismo de afirmar que foi incrível.
Vicente_Marjamäki
O duo de Luís Vicente e Jari Marjamäki foi outro grande concerto da noite. Apostando na fórmula de sucesso de misturar um jazz mais free e espiritual com música electrónica, levou-nos a imaginários entre uma Ibiza com bom gosto e um Chicago Underground consciente.
As colunas do espaço não permitiram ouvir os graves da electrónica de Marjamäki, mas nem por isso a música deixou de soar a férias e Verão. O domínio de Vicente no trompete jogou com a base electrónica e Marjamäki, por sua vez, processou o som do primeiro até este ser quase irreconhecível, se bem que o tamanho da sala e o volume nos permitisse ouvir sempre o som natural do instrumento de sopro. Desceu aos Anjos um mantra electro-house-jungle-jazz que podia ter-se prolongado durante horas sem se quebrar o feitiço.
Signsofthesilhouette & Hernâni Faustino
O trio Signsofthesilhouette apresenta-se como um projecto multidisciplinar tendo, para além da música, uma forte componente visual – aos dois músicos soma-se um videasta. Os membros da banda vestem-se de branco com máscaras da mesma cor e utilizam projecções (de Miguel Cravo) sobre si mesmos durante os concertos.
O papel dos homens-de-branco não poderia ser mais diferente, com a bateria de João Paulo Entrezende a pautar um som quadrado e a guitarra de Jorge Nuno (animal de palco), em modo noise, a disparar “feedbacks” por toda a sala. Era assim que deveriam soar os alarmes em caso de apocalipse zombie.
Mas o grande destaque da actuação foi para Hernâni Faustino, que esteve incansável no baixo eléctrico, a segurar o som e a deixar a guitarra brilhar.
Baoba Stereo Club & Mauricio Takara
Já pudemos ver Mauricio Takara como baterista, percussionista e cavaquinista (no Jazz em Agosto do ano passado, com Pharoah Sanders). Desta vez assistimos ao que fazia este multi-instrumentista atrás de um sintetizador, apenas porque a companhia aérea perdeu a mala em que trazia o trompete que também tocaria.
O quarteto Baoba Stereo Club, que para além de Takara conta com Bruno Gold no teclado, Henrique Diaz na guitarra e na percussão e Snoopy na bateria, apresentou um som atento às novas tendências da geração “indie”, entre a chillwave e um math-rock “sudamericano”.
Foi, porventura, o concerto mais desalinhado dos outros, mas era também o mais esperado, com muita gente a chegar de propósito para o mesmo. Os Baobas revelaram competência, mas não um grande entusiasmo. Ainda assim, no final, o público pediu mais e houve “encore”.