Hugo Antunes / Carlos “Zíngaro” / Miguel Mira
Tango vudu
A décima edição do Nervo contou com um trio constituído por Hugo Antunes no contrabaixo, Carlos “Zíngaro” no violino e Miguel Mira no violoncelo. Ficou evidente que esta prática musical – chamem-lhe improvisação de câmara – está longe de ter estagnado.
Num concerto composto por camadas de erudição sem peneiras, começámos por ouvir uma improvisação livre na linha dos influentíssimos AMM. O tango vudu tocado enfeitiçou os presentes, mas ainda assim surgiu a pergunta: continua a arte a ser capaz de se reinventar ou estávamos a assistir a uma estagnação de fórmulas, mesmo quando tocadas por músicos com tal mestria no domínio dos seus instrumentos como estes.
Desde que se mudou do Clube Recreativo dos Anjos para a Sociedade Guilherme Cossoul, o ciclo de concertos Nervo tem sido composto por dois “sets”, contando o segundo com um convidado para além do grupo da noite. O trio de Hugo Antunes, Carlos “Zíngaro” e Miguel Mira não teve convidado, e ainda bem. O intervalo foi muito importante para estes músicos reorganizarem as suas forças e partirem de volta para a guerra já com conhecimento do terreno.
Cultivando uma certa imagem de bruxa “new weird America”, Mira batalhou em prol da abstracção espiritual. Pertencente a uma resistência clássica que vai tanto beber a Wagner como a Pink Floyd, “Zíngaro” lutou por nunca deixar o som geral desarmonizar-se. Com todo um rol de novas ideias europeias, a saltar entre alianças, Antunes ora atraiçoava as melodias de “Zíngaro”, ora as texturas de Mira, lutando por um som que mostrou, definitivamente, que não estamos estagnados e há ainda muita música que merece ser ouvida.