20.º Jazz ao Centro: Banda Sinfónica da Filarmónica União Taveirense com Mário Laginha, 25 de Outubro de 2022

20.º Jazz ao Centro: Banda Sinfónica da Filarmónica União Taveirense com Mário Laginha

Um encontro improvável

texto: Sofia Rajado / fotografia: João Duarte

O Convento de São Francisco acolheu um concerto que juntou a Banda Sinfónica da Filarmónica União Taveirense com o pianista e compositor Mário Laginha, evento que marcou o encerramento do 20.ª  Jazz ao Centro. Foi um encontro improvável que resultou muito frutuoso.

Como uma lufada de ar fresco no panorama da música portuguesa, decorreu no dia 23 de outubro o concerto que juntou o pianista e compositor Mário Laginha com a Banda Sinfónica da Filarmónica União Taveirense (FUT). Integrado no Jazz ao Centro, fomos escutar este encontro pouco provável no Convento São Francisco, em Coimbra.

Se tivesse ocorrido na cidade de Lisboa, talvez houvesse outro destaque a nível nacional, dada a qualidade na interpretação musical destes músicos. Acabou por ser uma espécie de encontro regional revelando, mais uma vez, a importância na descentralização da cultura. O Convento de São Francisco, tal como o nome indica, é um antigo convento que foi transformado num espaço cultural.

Abriram-se as portas do grande auditório e este encheu-se. Havia um ambiente na sala de um certo suspense, alguma ansiedade e inquietação. Percebia-se que havia quem estava ali para ouvir Mário Laginha, e isso bastava-lhes, quem tinha a certeza absoluta de que a Banda Sinfónica da FUT daria mais um concerto brilhante, e havia ainda quem se questionava se esta mistura entre estes dois mundos distintos não seria ousada de mais. Uma coisa é certa, o nervosismo da espera, quando se sabe à partida que se vai ouvir algo de bom, era notório. Ouviu-se o aviso de início de espetáculo, os dados foram lançados. 

Apesar de se ter apresentado um alinhamento seguido, sem intervalos, o concerto esteve dividido em duas partes. Uma primeira apenas com a Banda Sinfónica da FUT, na presença de solistas na percussão, e uma segunda, já com Mário Laginha ao piano.

Embora habituada a ser dirigida pelo maestro João Paulo Fernandes, a banda entrou em palco sozinha e iniciou o concerto com a bateria a “dar entrada”. Apesar dos instrumentos que se seguiram transmitirem alguma timidez, ou até algum medo e insegurança, quer no ataque inicial das notas quer na afinação, rapidamente a Banda se equilibrou, reajustou e mostrou ao que vinha. Talvez tenha sido ousado iniciar o concerto sem o maestro em palco, mas a arte também é feita disso, de ousadia, e ainda bem. E já na presença do maestro Joao Paulo Fernandes, verificou-se claramente que é a sua batuta o fio condutor deste conjunto tão vasto de músicos, com uma relação muito próxima, diria até que um pouco emotiva, que se demonstra na forma genuína como a música se expressa.  

 


A Banda Sinfónica da FUT, tal como o nome indica, é composta essencialmente por sopros, aos quais se junta um naipe de percussão muito completo, e alguns instrumentos de cordas como o violoncelo, o contrabaixo, a harpa. 

De uma forma geral, na primeira parte a banda tocou obras com arranjos tendencialmente mais “jazzísticos”, com ritmos de swing e dixie muito presentes, revelando uma inspiração muito grande no compositor George Gershwin. Pudemos escutar um arranjo de “Porgy and Bess”, por James Barnes, bem como uma composição de Paulo Perfeito, “Rhapsodia em Blues”, inspirada na “Rhapsody in Blue,” com os solistas Jeffery Davis no vibrafone e Ismael Silva na marimba, demonstrando a sua elevada musicalidade

Na primeira parte, e ao longo de todo o concerto, evidenciou-se a forte presença e atitude da Banda Sinfónica. Os ataques certeiros, a afinação dos sons, os ritmos no tempo certo, as melodias com a ênfase necessária, os solos adequados e expressivos. Nem mais, nem menos. Dito isto assim, parece muito simples, mas não é. Juntar uma Banda Sinfónica, com os vários instrumentos presentes, com as diferentes “vozes” a formar muitas vezes harmonias dissonantes e difíceis aos ouvidos menos educados na escuta, transmitindo uma sensação de prazer ao ouvinte, é uma tarefa muito complexa e difícil. Mas resultou.

Se o ambiente já estava acolhedor, aqueceu ainda mais com a entrada de Mário Laginha. Apresentou o “Concerto para Piano e Orquestra”, composto pelo próprio. Tal como indica o nome, é uma obra com três andamentos, o primeiro e terceiro mais “allegro” (rápido), e o segundo mais “andante” (lento). Com uma estrutura com base na música clássica, contem uma presença muito vincada de elementos de jazz, como seria de esperar, dado o percurso deste músico.  Tendo o terceiro andamento demonstrado esse entrosamento entre clássica e jazz, com um momento de improvisação do músico, mas lembrado as comuns cadências da estrutura dos concertos clássicos. Diria que a estrutura é clássica, mas o conteúdo procura o jazz. E isso foi muito visível nas harmonias tocadas, nos movimentos cíclicos e algo circulares, nos sempre presentes ritmos sincopados, criando um diálogo entre piano e Banda sintonizado, com o espaço para a interpretação da leitura mas também para a ousadia de algum improviso.

E foi assim a tarde de Domingo. Um encontro improvável transformou-se num coração rico em emoções, algo que só a boa arte sabe transmitir.

Ao sabor das palmas e com uma expressão facial de genuína felicidade, Mário Laginha cumprimentava a Banda e levantava o seu polegar, como que acenando “boa”. Dirigiu-se ao microfone, e disse: “cheguei cá há dois dias, não os conhecia, e isto tinha tudo para correr mal…” arrancou uma risada da sala e um sorriso feliz de agradecimento do maestro João Paulo Fernandes e dos restantes músicos.
 

Agenda

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12 Abril

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ZDB - Lisboa

13 Abril

Tabula Sonorum

SMUP - Parede

14 Abril

Apresentação do workshop de Canto Jazz

Teatro Narciso Ferreira - Riba de Ave

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